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Assim como John Cage constatou por sua própria experiência que não existe silêncio absoluto, também penso que não há silêncio na fotografia. Aliás, existem sons o tempo todo...de todo tipo...muitos deles em frequência que não consigo escutar, mas estão ali.

Engraçado que sempre escutei de minhas fotografias algo parecido com o que conhecemos tradicionalmente como música: sempre as associando a sons que conhecia, o que mudava era o estilo, o ritmo, a melodia, mas sempre dentro do que conhecia. Mas, de alguma maneira, principalmente agora, sinto uma presença/ausência de sons que não consigo ainda escutar, ou talvez não consiga entender: sons do inconsciente?...imagens inconscientes?... Eles continuam ali...

Me dirijo agora para os não-intencionais. Os sons não-intencionais foram assim nomeados depois da caixa anecóica: dentro daquela caixa a prova de som, John Cage ainda escuta dois sons; um agudo e outro grave que, pelo que li, seriam o som do seu sistema nervoso em operação e o grave do sangue em circulação...não há silêncio, portanto. Há sempre um som, mesmo que não seja percebido: som não-intencional!

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Assim penso a fotografia!... não há silêncio absoluto. Nas fotografias estão presentes/escondidos os chamados sons não-intencionais...o que não são percebidos.

Ainda nesta reflexão sobre a relação da imagem com John Cage, trago outro elemento da obra do músico: o acaso..., talvez o acaso torne possível o encontro com os sons não intencionais.... Acho que o acaso proporciona o encontro com coisas que estão ocultas...não intencionais. Mas seria possível produzir imagens – fotografias não intencionais?...não existiria, no fundo, sempre uma intenção ao trabalhar com a fotografia?...imagens ao acaso é outra coisa...

Quando penso em fotografias ao acaso penso nas imagens feitas sem mira...foco...apenas o acionar de um botão. Enquanto escrevo penso no poema de Manoel de Barros – o fotógrafo: “Difícil fotografar o silêncio. Entretanto tentei. [...]Tinha um perfume de jasmim no beiral do sobrado. Fotografei o perfume. Vi uma lesma pregada na existência mais do que na pedra. Fotografei a existência dela. Vi ainda um azul-perdão no olho de um mendigo. Fotografei o perdão. Olhei uma paisagem velha a desabar sobre uma casa. Fotografei o sobre. Foi difícil fotografar o sobre.” Acho que o poeta pensa como o músico...

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